(Artigo de Opinião)

No dia 25 de Julho de 2014 pelas 14 horas a Assembleia da República aprovou, por maioria, o texto que, após promulgação pelo Presidente da República, se constituirá em Lei que modificará o enquadramento legal dos maus tratos sobre animais de companhia.
Depois de várias intervenções e alterações às
propostas iniciais, apresentadas por dois grupos parlamentares, e aprovadas na
generalidade em Dezembro de 2013, o articulado final do documento aprovado, com
4 artigos, incide directamente sobre duas peças legislativas existentes: o
Código Penal e a Lei 92/95 de 12 de Setembro.
Durante todo o período de discussão levantaram-se
críticas, muitas vezes com fundamentos opostos. Apesar disso fica a ideia que a
sociedade civil concorda com a criminalização dos maus tratos sobre animais de
companhia, com a introdução da pena de prisão para este tipo de ilícitos e que
este enquadramento é uma necessidade de uma sociedade moderna. Há também a
noção que a legislação é dinâmica e que é passível de ser modelada ao longo do
tempo, como de resto se verifica no próprio Código Penal português com as
sucessivas alterações e inserções.
Olhando para o articulado na nova lei (ver
abaixo a redacção final) um pouco mais detalhadamente:
O aditamento ao Código Penal (CP) implica
a inserção de um novo TÍTULO, o VI, dedicado aos animais de companhia.
Actualmente o CP tem no seu 2º Livro
(designado como Parte Especial), cinco títulos (crimes contra as pessoas, crimes
contra o património, crimes contra a identidade cultural e integridade pessoal,
crimes contra a vida em sociedade e crimes contra o estado). De notar que no
Título IV, dos crimes contra a vida em sociedade, tem no seu Capítulo III (dos
crimes de perigo comum) vários artigos relacionados com a natureza e ambiente (nomeadamente
274º, 278º, 279º e 279º-A, 280º, 281º) onde são referidos, de algum modo,
animais.
Atendendo à crítica que a introdução deste
novo título cria uma assimetria estrutural no código, poderemos concordar, mas
por via da assimetria já existente, que relega para artigos, secções e
capítulos dispersos algo que, actualmente são pontos essenciais das sociedades
modernas, a Natureza e o Ambiente, consignados inclusivamente na Constituição
da República Portuguesa (VII Revisão Constitucional, 2005) no seu artigo 66º (Ambiente
e qualidade de vida) que refere no seu ponto 1 “Todos têm direito a um ambiente
de vida humano, sadio e ecologicamente equilibrado e o dever de o defender”.
Deste modo, parece um ponto de partida
interessante a criação de um título no CP dedicado a animais de companhia, como
primeira pedra de uma restruturação que dê ao Ambiente e Natureza o relevo que deve
ter, a exemplo aliás do que acontece noutros países, amiúde citados como modelo
para esta alteração.
Claro que os animais de companhia, na sua
esmagadora maioria canídeos e felídeos domésticos, são muito mais, para os seus
detentores e sociedade em geral, do que simples “coisas da natureza”, já que o
vínculo que se estabelece entre os humanos e estes animais domésticos,
ultrapassa em muito a esfera do físico e palpável, do dever e do direito, são
muitas vezes componentes essenciais de uma vida saudável, no campo dos afectos
e equilíbrio emocional.
A redacção final, tal como foi aprovada na
especialidade e aceite pelo plenário, será a seguinte:
Artigo 1º
- Aditamento ao Código Penal
É aditado ao Código penal (…) o novo TÍTULO
VI, designado “Dos crimes contra animais de companhia”, composto pelos artigos
387º a 389º, com a seguinte redacção:
“Título VI – Dos crimes contra animais de companhia
Artigo 387º
Maus tratos a animais de companhia
1 – Quem, sem motivo legítimo, infligir dor,
sofrimento ou quaisquer outros maus tratos físicos a um animal de companhia é
punido com pena de prisão até um ano ou com pena de multa até 120 dias
2 – Se dos factos previstos no número
anterior resultar a morte do animal, a privação de importante órgão ou membro
ou afectação grave e permanente da sua capacidade de locomoção, o agente é
punido com pena de prisão até dois anos ou com pena de multa até 240 dias.
Artigo 388º
Abandono de animais de companhia
Quem, tendo o dever de guardar vigiar ou
assistir animal de companhia, o abandonar, pondo desse modo em perigo a sua
alimentação e a prestação d cuidados que lhe são devidos, é punido com pena de
prisão até seis meses ou pena de multa até 60 dias.
Artigo 389º
Conceito de Animal de companhia
1 - Para efeitos no disposto neste título,
entende-se por animal de companhia qualquer animal detido ou destinado a ser
detido por seres humanos, designadamente no seu lar, para seu entretenimento e
companhia.
2 – O disposto no número anterior não se
aplica a factos relacionados com a utilização de animais para fins de
exploração agrícola, pecuária ou agro-industrial, assim como não se aplica a
factos relacionados com a utilização para fins de espectáculo comercial ou
outros fins legalmente previstos.”
Artigo 2º
- Alteração à Lei nº 92/95, de 12 de setembro
São alterados os artigos 8º, 9º e 10º da Lei
92/95, de 12 de setembro, sobre protecção aos animais, alterada pela lei nº
19/2002, de 31 de julho, que passam a ter a seguinte redacção
“Artigo 8º
[…]
Para efeitos da presente lei considera-se
animal de companhia qualquer animal detido ou destinado a ser detido por seres
humanos, designadamente no seu lar, para seu entretenimento e companhia
Artigo 9º
As associações zoófilas legalmente
constituídas têm legitimidade para requerer a todas as autoridades e tribunais
as medidas preventivas e urgentes necessárias e adequadas para evitar violações
em curso ou iminentes da presente lei.
Artigo 10º
1 – As associações zoófilas podem
constituir-se assistentes em todos os processos originados ou relacionados com
a violação da presente lei e ficam dispensados de pagamento de custas e taxa de
justiça, beneficiando do regime previsto na Lei nº 83/95, de 31 de agosto, com
as necessárias adaptações
2 – Às associações zoófilas pode ser
atríbuido o estatuto das organizações não-governamentais do ambiente, nos
termos previstos na Lei nº35/98, de 18 de julho.
Artigo 3º
- Alterações sistemáticas
Os artigos 9º e 10º da Lei nº 92/95, d 12 de
Setembro, alterada pela lei nº19/2002, de 31 de julho e pela presente lei,
passam a integrar o capítulo IV, com a designação “Associações zoófilas”
Artigo 4º
- Entrada em vigor
A presente lei entra em vigor no primeiro dia
do 2º mês seguinte ao da sua publicação
(transposição do texto do ofício
nº871/XII/1ª- CACDLG/2014, DE 25-07-2014)
Anabela Santos Moreira
27 Julho 2014
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