“Tomei conhecimento da ligação entre
crueldade animal, abuso de menores, violência doméstica e abuso de idosos
durante a avaliação psicológica num caso de abuso sexual de um menor. O rapaz
estava mudo de pânico, até lhe ser perguntado se havia animais na casa. Depois
de começar a falar acerca do que tinha acontecido ao cão, conseguiu revelar o
que tinha acontecido com ele. A presença do cão foi verificada e usada como
evidência e o caso foi julgado com sucesso”* (Barbara W. Boat).
Esta experiência é relatada no prólogo do
manual “Understanding the Link between Violence to Animals and People: AGuidebook for Criminal Justice Professionals”, de Allie Phillips da National
District Attorney Association (NDAA) e publicado em Junho 2014.
Na continuação do prólogo, Barbara Boat
refere ainda que nos últimos 25 anos tem havido um enorme progresso neste campo
listando alguns pontos e actuações que têm contribuído para esse progresso. De
notar que em Portugal, tanto quanto é dado a conhecer ao cidadão comum, nenhuma
das “conquistas” referidas são sequer motivo de discussão, seja na esfera
pública seja na científica, nem mesmo através de campanhas de divulgação.
O que é o Link?
O Link (elo/relação/ligação) é uma expressão que, quando usada
no contexto do mau trato animal, se refere à ligação entre vários tipos de
violência e mau trato, independentemente do tipo de vítima. A expressão
anglo-saxónica é actualmente utilizada universalmente mesmo em comunidades/países
em que o inglês não é a língua materna.
O Link é relação que se pode traçar entre a
ocorrência de abuso ou negligência sobre um animal (incluindo agressão sexual,
lutas e acumulação) e outros crimes no contexto familiar tais como negligência
e abuso de menores (incluindo abuso sexual e físico), violência nas relações de
intimidade (incluindo stalking e violação), negligência e abuso de idosos
(incluindo exploração financeira).*
No entanto o Link não se esgota na esfera
familiar. A violência interpessoal e outro tipo de crimes também estão
incluídos nesta relação nomeadamente homicídio, armas ilegais, drogas ilícitas,
fogo posto, violação, assaltos.
Em Portugal devido à aproximação da votação,
na Assembleia da República, de legislação que pretende instituir a criminalização do
Mau Trato Animal (Portugal é dos poucos países da UE em que o Mau Trato Animal
não é crime, é apenas delito sujeito a contra-ordenação) assiste-se a uma
discussão mais alargada do assunto, e não é raro encontrar-se comentários, nas
redes sociais e nas notícias dos órgãos de comunicação social, que denotam
surpresa e algum desagrado acerca destas medidas, aparentemente duras, já que se trata “apenas de
um animal”.
Este tipo de justificação ou argumento não é
actualmente aceitável, não só porque os animais são seres sencientes, sentindo
dor, fome, sede, frio, alegria, tristeza, medo mas também porque o mau trato
dos animais faz parte de um continuum de violência que inclui os seres humanos.
É necessário que o mau trato animal seja
levado a sério, não só pelo dever que os humanos têm de proporcionar as
melhores condições a seres sencientes que são dependentes deles devido à
domesticação, mas também porque, quando existe, é um factor de risco para outras
situações de abuso e de violência futura.
Anabela
Santos Moreira
5 Julho
2014
* Phillips,
A., “Understanding the Link between Violence to Animals and People: A Guidebook
for Criminal Justice Professionals”, 2014, National District Attorney
Association
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